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segunda-feira, março 14, 2011

A hora da Estrela e Clarice Lispector

"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..." 
                                                                                                  Clarice Lispector
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Clarice Lispector continua sendo algo estranho e fascinante na literatura brasileira. Dotada de especial sensibilidade, sua preocupação maior nunca esteve no enredo, no linear das coisas. Exigiu, ao contrário, que o leitor se entregasse em meditação à aventura de ler, se quisesse desfrutar da profundidade dos conceitos que se multiplicavam.

A Hora da Estrela
O romance narra as desventuras de Macabéa, uma moça sonhadora e ingênua, recém-chegada do Nordeste ao Rio de Janeiro, às voltas com valores e cultura diferentes. Macabéa leva uma vida simples e sem grandes emoções. Começa a namorar Olímpico de Jesus, que não vê nela chances de ascensão social de qualquer tipo. Assim sendo, abandona-a para ficar com Glória (colega de trabalho), cujo pai era açougueiro, o que sugeria ao ambicioso nordestino a possibilidade de melhora financeira.
Sentindo dores constantes, Macabéa vai ao médico e descobre que tem tuberculose, mas não conta a ninguém. Glória percebe a tristeza da colega e a aconselha a buscar consolo numa cartomante. Madame Carlota prevê um futuro feliz, que viria de um estrangeiro que ela conheceria assim que ela saísse daquela casa, homem louro com quem casaria. De certa forma, é o que acontece: ao sair da casa da cartomante, Macabéa é atropelada por um homem que dirigia um luxuoso Mercedes-Benz e acaba morrendo. Esta é a sua "hora da estrela", momento de libertação para alguém que, afinal, "vivia numa cidade toda feita contra ela".
 Análise


Além da história de Macabéa, encontramos no romance a história de Rodrigo S. M., o narrador, e a descrição do processo criativo (discurso metalingüístico). Rodrigo e Macabéa não fazem parte do mesmo espaço periférico, esta por sua condição de retirante e aquele por ser visto com maus olhos pela classe média e não conseguir alcançar pessoas como Macabéa.
Toda a expressão do texto é para se explicar. Rodrigo acaba priorizando o relato dos recursos textuais a falar de Macabéa, que ironicamente só ganha papel de destaque perto da hora de sua morte. É nesse ponto que compreendemos o significado do título: A hora da estrela é a hora da nossa morte, pois, nesse momento, o ser humano deixa de ser invisível às pessoas, que percebem que ele existe apenas quando já não existe mais.
Clarice adota discurso regionalista em A hora da estrela, algo incomum em suas obras. Através da personagem Macabéa, a autora descreve uma nordestina que tenta escapar da miséria e do subdesenvolvimento, abandonando Alagoas pela possibilidade de melhores condições de vida no Rio de Janeiro. Clarice foi muitas vezes criticada por se afastar da literatura regional emergente do modernismo. Em A hora da estrela, ela foge do "hermetismo" característico de suas primeiras obras e alia sua linguagem à vertente regionalista da segunda geração do modernismo brasileiro. Na época da publicação, o crítico literário Eduardo Portella falou do surgimento de uma "nova Clarice", com uma narrativa extrovertida e "o coração selvagem comprometido com a situação do Nordeste brasileiro".
A hora da estrela é uma obra-prima da literatura brasileira, principalmente, pelas reflexões de Rodrigo sobre o ato de escrever, sua própria vida e a anti-heroína Macabéa.

Contexto e Publicação
Clarice comentou sobre A Hora da Estrela em sua única entrevista televisionada, concedida em fevereiro de 1977 ao reporter Júlio Lerner para a TV Cultura, de São Paulo. Na entrevista, ela menciona que acabara de completar um livro com "treze nomes, treze títulos", embora ela tenha se recusado a citá-los. Ela diz, que o livro é "a história de uma moça, tão pobre que só comia cachorro quente. Mas a história não é isso, é sobre uma inocência pisada, de uma miséria anônima."
Na mesma entrevista, Clarice diz que usou como referência para Macabéa a sua própria infância no nordeste brasileiro, além de uma visita a um aterro onde nordestinos se reuniam em São Cristóvão. Ela diz ter sido neste aterro que ela capturou "o ar meio perdido" do nordestino na cidade do Rio de Janeiro.

Outra inspiração para a trama do livro foi uma visita que Clarice fez a uma cartomante. Na época, ela imaginou como "seria engraçado" se na saída, ela fosse atropelada por um táxi depois de ouvir todas coisas boas que a cartomante previra.
A novela foi escrita à mão em diversos fragmentos de papel, a partir dos quais Lispector, com a ajuda da sua secretária Olga Borelli, compôs a versão final do romance.
 O livro foi publicado em 26 de outubro de 1977, pouco antes da autora ingressar no hospital do INPS da Lagoa, no Rio de Janeiro.



Estudando a Obra

Foco narrativo

Quanto à linguagem, o livro a apresenta fartamente, em todos os momentos em que o narrador discute a palavra e o fazer narrativo. Interessante notar que, antes de iniciar a narrativa e logo após a 'Dedicatória do autor', aparecem os treze títulos que teriam sido cogitados para o livro.
O recurso usado por Clarice Lispector é o narrador-personagem, pois conforme nos faz conhecer a protagonista, também nos faz conhecê-lo. Ele escreve para se compreender. É um marginalizado conforme lemos: "Escrevo por não ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há lugar pra mim na terra dos homens". Quanto à sua relação com Macabéa, ele declara amá-la e compreendê-la, embora faça contínuas interrogações sobre ela e embora pareça apenas acompanhando a trajetória dela, sem saber exatamente o que lhe vai acontecer e torcendo para que não lhe aconteça o pior.
Macabéa, a protagonista, é uma invenção do narrador com a qual se identifica e com ela morre. A personagem é criada de forma onisciente (tudo sabe) e onipresente (tudo pode). Faz da vida dela um aprendizado da morte.

Entrevista com Clarice Lispector Parte I
(1977)

A morte foi a hora de estrela.
O enredo de A hora da Estrela não segue uma ordem linear: há flashbacks iluminando o passado, há idas e vindas do passado para o presente e vice-versa.
Além da alinearidade, há pelo menos três histórias encaixadas que se revezam diante dos nossos olhos de leitor:
A metanarrativa - Rodrigo S. M. conta a história de Macabéa: Esta é a narrativa central da obra: o escritor Rodrigo S.M. conta a história de Macabéa, uma nordestina que ele viu, de relance, na rua.
A identificação da história do narrador com a da personagem - Rodrigo S.M. conta a história dele mesmo: esta narrativa dá-se sob a forma do encaixe, paralela à história de Macabéa. Está presente por toda a narrativa sob a forma de comentários e desvendamentos do narrador que se mostra, se oculta e se exibe diante dos nossos olhos. Se por um lado, ele vê a jovem como alguém que merece amor, piedade e até um pouco de raiva, por sua patética alienação, por outro lado, ele estabelece com ela um vínculo mais profundo, que é o da comum condição humana. Esta identidade, que ultrapassa as questões de classe, de gênero e de consciência de mundo, é um elemento de grande significação no romance, Rodrigo e Macabéa se confundem.

Porque ler a Hora da Estrela?
A Hora da Estrela de Clarice Lispector, é um “romance” diferente de todos os já lidos, isso se deve ao fato de a escritora fazer um jogo de personagens, tentando até mesmo se excluir, como narradora, mas que por fim, acaba por se contradizer mostrando realmente quem era, além de narradora, também personagem na figura de Rodrigo (narrador-personagem criado por Clarice); Rodrigo que também as vezes se confundia com Macabéa, personagem criada por ele (e conseqüentemente por Clarice), já que essa (Macabéa) é criada e levada a morte por essa descrição, descrição marcada com uma linguagem que a desfigura e a constrói ao mesmo tempo.

Entrevista com Clarice Lispector Parte II
(1977)

Na verdade, a expressão “romance” supra citada, foi propositadamente posta entre aspas, pelo motivo de que a própria autora, não sabia, ou melhor, não queria, classificar sua obra como romance, ou como novela, enfim, pois para Clarice, não mais importava essa questão de classificação em gêneros, para ela o texto apenas existia, seu encaixe em determinado gênero não iria mudar nada, o que está escrito, está escrito e pronto, cada leitor é que deveria tirar suas próprias conclusões.
Os leitores de A Hora da Estrela podem estar se perguntando o porquê de Clarice ter criado Rodrigo para narrar a história de Macabéa, isso ocorreu porque ela queria narrar de forma distante, sob o ponto de vista masculino, já que se fosse a narração feita por uma mulher, com certeza teríamos um cunho mais sentimental, e não era esse o interesse de Clarice, ela refletia. muito sobre a situação de submissão das mulheres, ela achava que a felicidade só acontecia ao lado de um homem, por isso também a história é narrada por um homem, para que fosse afastada de todo esse sentimentalismo lacrimoso das mulheres, “homem não chora”.

Clarice Lispector, sofria muito com a posição dos críticos, que diziam que sua obra não estava de acordo com o esperado na época. Argumentavam que suas produções não tinham um cunho social, que era o que marcava os textos daquele momento. Na verdade, toda a obra de Clarice não tinha mesmo essa preocupação, ela escrevia e pronto, não procurava escrever sobre o que os outros estavam acostumados a ouvir, ou querendo ouvir. Desde nova, quando escrevia histórias infantis ao jornal de Pernambuco, seus textos não eram publicados, por se tratarem, segundo o editor do jornal, de textos muito fragmentados e complicados.
É relevante pontuar, que a obra de Clarice realmente não é simples de se ler, ela requer uma certa reflexão do leitor, as cenas não estão descritas de forma tão explícita, de modo que não nos leve a uma reflexão mais profunda, no entanto, em A Hora da Estrela, Clarice tentou “retratar” um pouco essa questão social, não de forma tão explícita, mas sim nas entrelinhas. Pode-se notar isso, quando ela, por exemplo, fala do médico, médico de pobres, que como acontece no dia-a-dia odeia o que faz, e as pessoas menos favorecidas têm que se submeterem a esse tipo de serviço, com esse tipo de “profissional” que não está satisfeito com o que faz e com a quantia que recebe.

Entrevista com Clarice Lispector Parte III
(1977)
Percebe-se também, essa questão citada acima, na própria história de Macabéa, que é a história de milhares de nordestinos (pobres), que vem para a cidade grande tentar ser alguém na vida, ocupar o seu espaço, e o que acontece? Nada de novo acontece, vêem e, na maioria das vezes, passam por situações piores do que as que viviam no interior, em sua terra natal.

Se essas pessoas eram pouco importantes, insignificantes onde viviam, serão mais ainda na cidade grande, na capital, onde cada um quer saber de si, onde cada um tem que “se virar”, onde amizade, solidariedade, são palavras que não existem. Essas pessoas passam a ser apenas mais um dentre tantos; são pessoas substituíveis, que tanto faz morrerem ou não, existirem ou não.

Entrevista Clarice Lispector Parte IV
(1977)
É justamente sobre essa questão da inutilidade, do “ser mais um”, que trata o “romance”  A Hora da Estrela, que mostra esse processo de massificação a que todos estamos submetidos. Nessa narração, ou melhor, metanarrativa, a autora quer justamente nos levar a essa reflexão, afinal, quem somos? Para que vivemos? Qual é o nosso papel na sociedade? Será que fazemos falta, ou somos apenas mais um? Somos importantes? Será que no fundo, também não somos uma Macabéa da vida?

Fontes:
Wikipédia,
Mundo que Lê
Vestibuler.blogspot.com
A Hora da Estrela; Lispector,Clarice


Entrevista com Clarice Lispector Parte V
(1977)
Adaptação de A Hora da Estrela para o Cinema
Prêmios: INTERNACIONAIS:


FESTIVAL INTERNACIONAL DE BERLIN - 1986
Melhor Atriz : Marcélia Cartaxo
Menção Especial OCIC

Menção Especial Confederação Internacional Cineclubes
FESTIVAL INTERNACIONAL CRETEIL - 1986
Melhor Direção : Suzana Amaral
FESTIVAL DE HAVANA - 1986
Melhor Filme
ACADEMIA DE CINEMA ARTES E CIÊNCIAS DE HOLLYWOOD - 1986
Indicado pelo Brasil para Competição de Melhor Filme Estrangeiro
FESTIVAL DE CINEMA DOS PAISES DE LINGUA PORTUGUESA AVEIROS - 1988
Melhor Filme

NACIONAIS:
FESTIVAL DE BRASILIA - 1985
Melhor Filme
Melhor Direção : Suzana Amaral
Melhor Roteiro : Suzana Amaral/ Alfredo Oroz
Melhor Atriz : Marcélia Cartaxo
Melhor Ator : José Dumont
Melhor Cenografia : Clóvis Bueno
Melhor Fotografia : Edgar Moura
Melhor Trilha Sonora : Marcus Vinicius
Prêmio da Crítica
Prêmio do Júri Popular
Prêmio OCIC
GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO - 1988
Melhor Atriz : Marcélia Cartaxo
Melhor Direção : Suzana Amaral
Melhor Montagem : Idê Lacreta
FESTIVAL DOS FESTIVAIS DE CINEMA BRASILEIRO DE NATAL - 1992
Melhor Filme - Júri Popular

Trailler de A Hora da Estrela

Um comentário:

Obrigada Pela Visita!
Seja Sempre Bem Vindo!
:)